Rio capital da bicicleta é um programa da prefeitura do Rio de Janeiro que quer, em poucos anos (até a Copa do Mundo, imagino eu), dobrar a extensão da malha cicloviária da cidade (hoje 150km). Com 300km de ciclovias o Rio de Janeiro ultrapassará Bogotá, capital da Colômbia, e se tornará a cidade da América Latina com a maior malha cicloviária. E assim se tornará capital da bicicleta. Será?
Tem quase um ano que a bicicleta entrou no meu dia-a-dia. Antes disso eu achava uma falta de amor próprio usar bicicleta para se deslocar pela cidade. Muito perigoso dividir a rua com os carros, com os ônibus, até com os pedestres. Hoje eu posso falar com toda a propriedade sobre o assunto: de fato existe algum perigo, mas sendo prudente e, principalmente, respitando as regras de trânsito, é possível.
E se alguém por acaso me perguntasse, hoje: o que você faria para transformar o Rio na capital da bicicleta? Se eu fosse um burocrata talvez eu dissesse: aumentaria a malha cicloviária! Eu não sou um burocrata (felizmente). Eu sou uma ciclista. Eu sei que pintar umas bicicletas no asfalto e pregar umas placas no poste não são um meio muito eficiente de explicar para a sociedade (aqui incluo os próprios ciclistas) que deve haver espaço e segurança para todos que desejam se movimentar dentro das cidades.
Educação é a chave. Não tem atalho. E se aqui eu estou citando o problema da mobilidade urbana é porque sigo a vocação desse espaço. Não, eu não acredito no professor como salvador do mundo, como mártir. Educação não é responsabilidade somente da escola regular, é responsabilidade também da família. É o que está na nossa constituição federal.
Aqui no Grajau (um bairro residencial na Zona Norte do Rio de Janeiro), onde moro, no começo desse ano encontrei a primeira pista de que o programa Rio capital da bicicleta me visitaria: uma enorme placa com a logo do programa, o custo das obras, os prazos. Quando a movimentação das máquinas começou, descobri que uma ciclovia (ciclovia mesmo, com uso exclisivo para bicicletas) seria colocada na rua que liga o meu quarteirão ao Shopping Center da região, um trecho de não mais que 800m (que eu estava cansada de fazer de bike). Essa rua tinha uma única pista bem larga, com a ciclovia a pista ficou bem estreita.
Separando a ciclovia da pista colocaram uns olhos de gato que são incapazes de segurar os carros na sua pista, mas que são altos o suficiente para fazer com que um ciclista encontre facilmente o chão ao tentar atravessar. Em um outro trecho, entretanto, a ciclovia divide espaço com umas vagas para estacionar carros. Delimitar no chão as vagas e a ciclovia te parece o suficiente? Afinal é só o caso de indicar ao motorista os limites da sua vaga. Certo? Errado! Os engenheiros da prefeitura consideraram mais prudente colocar um guard-rail separando os carros parados da ciclovia. Vai entender...
Mas a pergunta que não quer calar é: sinto-me mais segura para pedalar por esse trecho, agora que tenho uma ciclovia a meu favor? Não, categoricamente. Só para vocês terem uma ideia, até ameaçada de morte por um taxista eu já fui nessa ciclovia (algo do tipo "vou passar por cima"). Isso porque eu tive que ir para a pista dos carros por conta de um outro taxi que estava, vejam só, parado na ciclovia! Mundo redondo.
Aliás, carro parado (até estacionado) nessa ciclovia, não é coisa incomum. Uma outra historinha ilustrativa: certa vez o Victor se queixou a uns PMs da sua viatura, parada na ciclovia. Foi xingado (xingado!) pelos policiais. Juro que sinto uma certa inveja daquele Prefeito da Lituânia que passou com um blindado por cima de um carro de luxo parado na ciclovia. E não são apenas os PMs, também os Guardas Municipais parecem completamente alheios às intenções da Prefeitura de transformar o Rio na capital latina da bicicleta. Outro dia, eu e Victor fomos para a Lapa (o bairro que é berço da boemia carioca e que tem uma vida noturna agitadíssima) e resolvemos prender as bicicletas na frente de um posto da Guarda Municipal (Choque de Ordem, para os que conhecem). Para nossa completa surpresa, um dos Guardas se aproximou de nós dizendo que nós não podíamos parar ali. Sabem porque? Porque, nas palavras dele, se as nossas bicicletas fossem roubada dali, nós culpariamos a Guarda Municipal! Oh, e agora quem poderá nos defender? O desenrolo levou uns 15min até convencermos os guardas a "deixarem" as nossas bicicletas presas lá.
Tudo isso dito (será que alguém conseguiu chegar até aqui? hehe), acho que não resta dúvida de que para transformar o Rio na verdadeira capital da bicicleta falta muito mais do que 150km em ciclovias. Falta educação.
Certa vez fui chamada de corajosa por um motorista no trânsito. No dia em que o Rio for a capital da bicicleta espero ser promovida a cidadã!